The Lurker em dia de cibernostalgia (ou "Excuse me, m´am. Did I leave my boots under your matress?")
Hoje me descobri analisando o quanto minha relação com a informática mudou nos últimos 15 anos. Sou, como se diz, da era do bit lascado. Meu primeiro computador que não se parecia com uma caixa de fósforos com teclado tinha um floppy de 120kb (algumas imagens pequenas hoje tem este tamanho) e cada disquete custava US$ 5,00. Então cortávamos um pedacinho do lado esquerdo para poder usar o verso do disquete. Afinal, só existiam discos importados e nem sempre era fácil conseguir um, em tempos de Sarney e reserva de mercado de informática. Hard Disk era uma coisa impensável e impagável. E mesmo que desse para comprar, ia ter uns 5Mb.
Lembro-me de meu assombro quando descobri na casa de um amigo que existiam computadores ligados na televisão e que geravam imagens coloridas (16 cores, veja bem). Corri para casa e arranjei um adaptador para liga o meu numa velha Philips à válvula.
Internet? Como? Naqueles tempos havia um programa pela Embratel chamado Cirandão (ou projeto Ciranda, seu antecessor). Basicamente era um sistema de chat e correio eletrônico muito primitivo, que funcionava com um fabuloso modem de 300bps (isso aí, senhores e senhoras que reclamam de seus 56000bps hoje em dia). – time passes –
Um pouco mais adiante, os poucos aventureiros que, como eu, se metiam neste mundo pela primeira vez eram confrontados com terminologias interessantes e pessoas misteriosas. O “importador” de quem comprei meu primeiro PC (um XT 8088) foi duas vezes à minha casa para ter certeza que não era “cilada”. Lembro-me de ter perguntado se o computador viesse sem relógio (clock) não saia mais barato. O cara não ouviu a pergunta porque Deus protege os inocentes e os ignorantes.
Um pouco mais adiante usavam-se os serviços de BBS, através de linhas discadas leeentas, voando agora a 9600bps. Haviam as sérias e as piratas. As gratuitas, as restritas e as pagas (a Mandic começou assim). Os tipos exóticos que se encontrava nas vias da informação eram cada vez mais interessantes. A linguagem era hermética e facilmente se reconhecia quem era do meio e quem estava de firula. Ainda hoje é fácil identificar o pessoal desses tempos perguntando quem sabia o que era uma Black Box. Era o reino do Blue Wave, do ASCII. – time still passes –
Mudaram os processadores aumentaram as velocidades. Entrou a série 386 (eu pulei a 286, que esse negócio estava caro). A complexidade das conversas e dos tipos crescia à medida que se conseguia maior e melhor performance. Com meu 486 veio o acesso aos sistemas da universidade e, como não poderia deixar de ser, à Bitnet (céus, como isso era arcaico). Mas ainda se conversava coisa séria, ciência, política, cultura, pesquisa. Tudo bem, eu não tinha lá muita compreensão disso na graduação, mas foi melhorando até conseguir minha primeira conta Internet. Uau! A coisa só funcionava emulando janelas UNIX (e ele não caía, como certas interfaces gráficas metidas a sistema operacional)... Mas os preços sim e a necessidade de uso da máquina cada vez mais crescia – even now time passes –
Mas o porque desta digressão ao mundo do passado cibernético recente, se comparado às eras geológicas, ou longínquo se considerado o tempo de vida de um pernilongo? Bem, basicamente o que se via então era um respeito muito maior pelo espaço cibernético, que era mais dedicado ao processo de troca de informações, arquivos e idéias entre pessoas. Me chame de besta, mas dava mais prazer mexer com essas coisas então. Agora essas facilidades todas permitem que um número enorme de bobagens fique circulando por aí...
Hoje, pela não-sei-qual-ésima vez, minha primeira atividade ao abrir meu e-mail foi matar o enorme número de mensagens não solicitadas que ultrapassaram não um mas dois softwares de bloqueio de SPAM. Saudades do tempo em que essa poluição não existia e em que, conquanto as interfaces gráficas não fossem tão bonitinhas, havia respeito pelo espaço dos outros. Admito que a quantidade de informações e a velocidade talvez não fosse tão grande, mas a quantidade de bobagens que eram jogadas ao vento eram a centésima parte do que se vê hoje. A democracia é uma coisa interessante: joga contra seu próprio patrimônio quando não vem acompanhada de respeito e educação.
The Lurker Says: A responsabilidade e a educação deveriam seguir, pelo menos em parte, o avanço da tecnologia.
março 14, 2003
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